Frequentemente, quando Stacey Carroll, que possui perda auditiva profunda, vai ao cinema, os óculos não captam todas as linhas da legenda ou o dispositivo deixa de funcionar. Normalmente, ela está com outras pessoas (ouvintes) que se sentem mal e saem do cinema com ela.
"Quando os meus filhos quiseram ver Star Wars em família, eu fiquer no meu próprio carro", afirma Carroll. "Tenho dois dispositivos, e nenhum funcionou. Voltei para casa para que o resto da família pudesse aproveitar o filme. Mesmo que reembolsem o meu ingresso, isso estraga a minha noite e já chorei mais de uma vez por causa disso."
É provável que esse seja um cenário familiar se você sofre de perda auditiva. Sentir muita ansiedade enquanto espera para ver se o dispositivo de legendagem funciona em um cinema é um sentimento comum. Apesar de estarmos gratos pelas tecnologias, temos muitos vouchers que não compensam por uma noite arruinada.
Falha de legendas
O problema tem atraído muita atenção ultimamente, principalmente com as recentes reivindicações públicas de Nyle DiMarco. Ele foi ao cinema pela primeira vez em 5 anos e teve problemas em ajustar o seu CaptiView (o dispositivo de legendas) e teve de mudar de posição porque tinha dificuldade em ver a tela. A sua frustração fez com que saísse ao fim de 10 minutos.
No entanto, no caso de Nyle, o problema foi culpa dele. Ele não foi para o cinema cedo o suficiente para configurar o seu CaptiView. Aliás, ele teve sorte de um estar disponível. Os que estão bem familiarizados com o CaptiView sabem que, por vezes, ele pode demorar um pouco para ser configurado corretamente, o que inclui conseguir ver as legendas e a tela como se fosse uma televisão.
E se for mais cedo e fizer tudo certo, mas mesmo assim o dispositivo falhar, como no caso de Carroll? Isso aconteceu recentemente com Mary Reed, uma grande amante de cinema. Embora ocorram falhas ocasionais, as legendas normalmente funcionam. No entanto, quando foi a um cinema renovado com um grupo de sete pessoas para ver Oito Mulheres e Um Segredo, foi confrontada com ignorância e desprezo quando pediu o equipamento de legendas ocultas para ela e o seu filho. Sem querer estragar a noite, Reed sugeriu que o resto do grupo, incluindo a sua filha, fosse conforme planejado.
Reed saiba que existia uma lei, mas queria se preparar com conhecimento específico antes de o gerente chegar, então publicou no Facebook. Quando ele não apareceu, ela encontrou um cinema a oito quilômetros de distância que estava passando o filme. "A noite teve um final feliz pois a legenda funcionava perfeitamente lá, mas tivemos de nos separar do nosso grupo para ver o filme", afirma.
A lei
O que É a lei? O Departamento de Justiça publicou uma decisão final no ADA (Lei dos americanos portadores de deficiências) no que se aplica a cinemas, referenciando especificamente o título III, que abrange adaptações públicas. Os cinemas americanos têm três principais requisitos. Devem:
- ter e obter o equipamento necessário para fornecer legendas ocultas e descrição de áudio no assento do espectador do cinema sempre que seja exibido um filme digital produzido, distribuído ou disponibilizado de outra forma com estas características;
- avisar o público sobre a disponibilidade dessas características, e
- assegurar que o pessoal do cinema esteja disponível para ajudar espectadores com o equipamento antes, durante e depois da exibição de um filme com essas características.
Exceções incluem cinemas ao ar livre e cinemas que apenas exibam filmes analógicos. Os regulamentos especificam quantos dispositivos cada cinema deve ter, exigem que estejam em funcionamento e exigem que um funcionário que saiba operar o dispositivo esteja sempre presente. Esses regulamentos entraram em vigor em 2 de junho de 2018.
Praticamente todos os filmes lançados atualmente são distribuídos como um pacote de dados digitais, portanto, é seguro presumir que qualquer cinema que exiba filmes recentes use projeção digital e, portanto, esteja sujeito às novas regras, afirma John Waldo, um advogado com perda auditiva que trabalha com acesso a filmes há cerca de 10 anos.
Waldo acrescenta que se o site de um cinema não indicar que as legendas estão disponíveis, então o cinema não está em conformidade com o regulamento, sendo a exceção os cinemas que passaram para projeção digital após 2 de dezembro de 2016, tendo esses até 2 de dezembro de 2018 para estar em conformidade.
Conformidade
Um problema com esses regulamentos é que não existe um padrão para o que constitui um funcionamento correto, deixando questões em aberto, por exemplo, se uma falha ocasional constitui uma não conformidade. "De modo geral, no entanto, os dispositivos de visualização de legendas que receberem manutenção adequada, forem carregados corretamente etc. transmitirão praticamente todas as linhas da legendagem", afirma Waldo. "Algo mais que uma omissão muito ocasional provavelmente exige alguma manutenção, mas depois disso, não deve existir grandes problemas na qualidade."
"Uma violação temporária da ADA é perdoada se for resultado da necessidade de manutenção ou reparos, mas o cinema deve mostrar que está trabalhando para resolver o problema e não simplesmente ignorando", afirma Waldo.
Quando a não conformidade consistente em falha de equipamento/manutenção, a solução normalmente é uma entrada gratuita para outra sessão. Se ocorrerem falhas repetidas, considere apresentar queixa junto ao departamento de justiça. "Os cidadãos não podem reaver danos ou multas de acordo com a ADA, mas alguns Estados dos EUA permitem reaver danos (por vezes em uma quantidade mínima), como US$ 4000 na Califórnia ou US$ 300 no Texas", afirma Waldo. "Se a não conformidade consistir na falta de equipamento para legendas, vale a pena considerar um processo privado", afirma. "O espectador continua sem conseguir compensação monetária, apenas uma ordem para o cinema fornecer o acesso", afirma Waldo. "No entanto, o cinema terá de arcar com os honorários dos advogados e isso serve de incentivo para fornecerem acesso."
Em última instância, cabe aos consumidores manter os cinemas sob controle. "Não existe, claramente, um policiamento eficaz das legendas além do que fazemos nós mesmos", admite. "Ainda há trabalho a ser feito."
Ações
Tina Childress, uma profissional de saúde auditiva educativa que também é uma adulta com surdez tardia, e Rachel Arfa, uma advogada com perda auditiva profunda, estavam curiosas com as tendências em acessibilidade em cinemas. Enquanto assistiam a filmes, ambas tiveram problemas com o CaptiView e viram vários comentários no Facebook de outros usuários também com problemas. Elas criaram uma pesquisa online para coletar feedback sobre legendagem de filmes; está em andamento.
Na perspetiva de Childress, os problemas incluem:
- Cuidado/manutenção/uso do equipamento: o equipamento fica desatualizado e nem sempre é substituído/reparado atempadamente
- Os consumidores não saberem como solucionar problemas no equipamento
- Os cinemas não terem um plano B implementado, o que incluiria melhor treinamento do pessoal
Enquanto isso, no Reino Unido não existe ADA, mas existe o Equality Act (Ato de igualdade) de 2010, que afirma que as organizações devem fazer ajustes razoáveis aos seus serviços para os tornar acessíveis. O problema é não existir um esclarecimento concreto sobre o que é "razoável", afirma Ellen Parfitt, uma blogueira e ativista com surdez profunda. "Pensam que o que estão fazendo atualmente é razoável, mas 1% a 3% é razoável?" pergunta. "Eu não acho."
O 1% a 3% refere-se à porcentagem média de filmes por semana que são legendados. Parfitt criou uma petição há um ano, que tem cerca de 5 mil assinaturas, para mostrar aos cinemas a procura por exibições legendadas. Também está trabalhando com uma grande instituição de caridade ,após esgotarem todas as opções, os procedimentos legais são possivelmente o que se segue.
Parfitt também está reunindo pesquisas e evidências do número de exibições de cinema legendadas em comparação com exibições não legendadas, assim como das reações das pessoas às legendas. Ela escreveu uma publicação de blog sobre os seus esforços.
Nos EUA, com o regulamento nacional de legendas, "é possível que realmente consideremos que a missão foi cumprida em relação a esta meta antiga", afirma Waldo. "No entanto, cada um de nós, nas nossas comunidades, temos de dar os passos finais para tornar isso uma realidade."
Reed fez a sua parte. Foi do cinema para casa e causou o caos. O proprietário respondeu a ela – no Facebook e por e-mail – e pediu desculpas. Ele assegurou a ela que a tecnologia de legenda estava a caminho e que falaria com os funcionários. "Darei outra chance a esse cinema", afirma.